9 de junho de 2007


Ví num Fotolog (http://www.fotolog.com/lica_smilehappy/ ) e resolví republicar:


Rap é discurso de meninos de rua

As letras cantadas pelos menores que vivem nas ruas são em sua maioria raps que falam de abandono e violência por parte dos pais ou da sociedade. A conversa de J. de 13 anos com um rapaz dentro de um ônibus intermunicipal na tarde de quarta-feira (30) ilustrou essa realidade.

Descalço, sujo, sem agasalho e vindo da cidade de Franco da Rocha, o menino disse estar em Santos para andar nas praias. Mas antes de perguntar para o rapaz sentado ao seu lado se o ônibus iria para o Canal 1, perguntou primeiro se ele poderia lhe dar um cigarro. Conversando com o passageiro, o menino confessou ser usuário de crack, droga produzida da mistura de pasta de cocaína com bicarbonato de sódio. O crack é uma das drogas que mais caracterizam o cenário de violência social das grandes cidades. Por ser mais barato e possuir um alto poder de vício, se tornou a droga mais usada entre os moradores de rua.
O diálogo entre J. e o passageiro era difícil, ele dizia não gostar de ser questionado. E quando não queria responder, cantava um rap relacionado à pergunta. O menino estudou até a sexta série do Ensino Fundamental, e afirmou que seu pai estava em São Paulo e não era do “partido”. “Se fosse ele estaria aqui fumando uma pedra comigo, mas é melhor não, senão ia viver apanhando que nem um vagabundo.” Quando o passageiro perguntou se J. tinha algum sonho, a resposta veio de um hino cantado por muitos meninos de rua. “Meu sonho é amarrar minha mãe na cama pôr querosene e meter fogo”. Trechos como esse do rap “Eu não pedi pra nascer” do grupo Facção Central foram cantados por J. ‘justificando’ sua resposta. “À noite as costas arderam no coro da cinta”, e no final da música o verso “Mãe, devia te matar, mas não sou igual a você. Em vez de me sujar com seu sangue eu prefiro morrer”.

O rapaz ao lado continuava tentando conversar, e perguntou por que o menino não tentava sair daquela vida. O rap escolhido para responder foi “Vida Loka (parte 2)” dos Racionais Mc’s. “O cheiro é de pólvora e eu prefiro rosas. E eu que sempre quis um lugar gramado e limpo, assim, verde como o mar”. J. não queria mais conversar, apenas cantava os raps deitado no banco do ônibus, que passava pelo Canal 3.

Depois de cantar parte do funk “Toque da Cadeia” do Mc Gil do Andaraí, J. perguntou se o Canal 1 já havia passado. “Caraco tio, você nem me avisou”, ele gritou quando outro passageiro disse que aquele ônibus iria para Cubatão, e não para a praia. Então J. levantou mancando por causa do pé machucado e pedindo moeda para a senhora que descia no mesmo ponto que ele.

No ponto seguinte um garoto, com os mesmos olhos azuis e cabelos loiros de J. não atraiu tanta atenção dos passageiros. Com a camisa de uma escola da prefeitura de Santos, e uma sacola com pães na mão, ele olhava pra cima querendo dar sinal. Chamou o senhor ao lado e pediu que ele puxasse a cordinha. Desceu quieto, sem cantar música alguma.

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